07/04/2009

Um vício cotidiano

O chão agora está seco e o sol brilha saindo de traz das nuvens. Em quadros, observo pela janela de meu quarto úmido e triste... Mais um sol nascer. As gargalhadas infantis vindas da rua me estremecem, todos acham graça da vida e de mim. Gritos pontiagudos ferem meus ouvidos, mesmo que tampados por minhas mãos notoriamente sujas de sangue. Vizinhos criticam minhas olheiras e principalmente meu braços infestados de veias já estouradas.Lembro-me dos tempos em que realmente fui feliz, assim como as crianças na rua, eu gargalhava. Com um abraço sonhava, com teus beijos acordava. Hoje, ao aproximar-se à hora da tua volta escondo-me dentro de mim mesma, cubro-me e apavoro-me loucamente. O girar da chave na fechadura, acelera meus batimentos e derrama sob o chão gélido minhas gotas esperançosas e quentes de lágrimas sofridas.

De costas para a porta, sentada ao chão... Fecho meus olhos para ouvir claramente os seus passos em minha direção. É como se eu pudesse conversar com suas pisadas, e elas me xingam, me dilaceram, me desesperam. Sinto por meus cabelos, teus dedos sujos deslizarem. Trêmula, levanto-me para de perto me enxergar. Teu cheiro insuportavelmente cítrico trinca minhas vias nasais como o presente que deixas na cabeceira de minha cama a cada manhã. Pega-me fortemente, sorri cinicamente com estes dentes quebrados por crack. Enoja-me imaginar teus lábios encostarem-se aos meus, e por isso, nego-te meus beijos.

Retomando assim o cotidiano infeliz em que vivo. Toda minha reserva já não me serve, todo meu maior medo vem à tona... E obrigatoriamente sua, torno-me.Dá-me as costas e em minha cama se encosta, juro com a junção de toda minha fé que prefiro jogar-me ao precipício do que deitar-me ao lado deste infeliz. Já não posso esperar por um amanhã, pois a cada dia que se passa crio mais desamor e rancor, a cada amanhecer por minha alma adentram farpas de insegurança. Esperando assim por meu ânimo, cada gota injetável, carreira que possa até o fim inalar, o que seja, até mesmo um fumo ou cerveja. A cada passo que dou me distanciando desta vida à procura de luz, tua solidão me seduz. Corpo, alma, obsessivo fascínio vicioso. No que me tornaste, monstro?

2 comentários:

  1. Carla Priston9/4/09 10:24 PM

    Falso mundo de ilusões verdadeiramente perurbadoras. Como brincas com as palavras?

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  2. Muito belo e forte o texto. Parabéns!!!

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Obrigada pela atenção ;)